Encontrei-o já inanimado
E dediquei-me às exéquias
Tinha sido estrangulado:
Apresentava petéquias...
Algo havia nele escrito
Que não seria agradável
Por isso foi sentenciado
Como poema descartável,
Trouxe-o desta feita
Para este embalsamar
Pois achei mais de acordo
Com o seu precoce finar,
Retirei-lhe os órgãos
Bem à egípcia maneira
E guardei-os em canopos
Dispostos numa fileira,
Alinhados pelo valor
Em primeiro o coração
Depois os outros seguidos
Em decrescente titulação,
Mergulhei-o em natrão
Uma poderosa salmoura
Para o lograr desidratar
Como se um peixe fora,
Enrolei-o em faixas largas
De linho alvo e fino
E enchi-lhe de algodão
O esvaziado intestino,
Depois os produtos apliquei
Em camadas sucessivas
Incensos, bálsamos, óleos
E outras matérias votivas,
E para terminar bem a obra
Depois vieram os vernizes
Aplicados em pinceladas
Para realçar os matizes,
Dos contornos do defunto
Concedendo-lhe permissão
Para ir para o outro mundo
Com solene tributação,
E ficou assim pronto
Para o Osírico tribunal
Faltava só o sarcófago
De raíz de nogueira, normal,
E escrevi em hieróglifos
Esta apropriada elegia:
- Eis a múmia de um poema
Que não viu o fim do dia.
Se alguém o quiser sepultar
E colocar-lhe um epitáfio
Tem a minha permissão
Para lhe erigir um cenotáfio.
22-11-2019 - 12.30
Sem comentários:
Enviar um comentário