Todos nós sabemos mais ou menos do atraso do nosso país em relação aos nossos parceiros europeus e é voz corrente que vivemos num país atrasado,
marcado pelas vicissitudes da história, acorrentado aos esquemas arcaicos e à mentalidade bacoca herdada de outros tempos. Mas afinal (graças a Deus) isto não é verdade.
Não é verdade e a realidade é, felizmente, precisamente o contrário!
Descobri um dia destes que vivemos afinal num país evoluidíssimo.
À nossa volta pululam sociólogos e psicólogos, gente de horizontes amplos, todos eles analisando os reflexos condicionados e o comportamento uns dos outros, classificando-os
e enquadrando-os em diversos organigramas, evoluindo assim para uma humanidade mais apreciadora das coisas verdadeiramente importantes da vida como a espionagem e o “voyerismo”. Maravilhoso!
E eu a julgar que a maioria das pessoas se estava positivamente “marimbando” para esses assuntos do foro académico e afinal era mentira.
Com o advento do programa “Big Brother” saíram do armário os talentos científicos que a população portuguesa vinha há tanto tempo
ocultando sob a capa da bisbilhotice e do cretinismo.
Afinal era eu que estava errado, confesso.
Nunca me passou pela cabeça que os telespectadores deste programa não fossem mentecaptos mas sim observadores atentos do comportamento individual (psicólogos)
e analisadores exaustivos dos fenómenos sociais (sociólogos).
A primeira vez que dei por este fenómeno foi à meia-noite de uma quarta-feira.
Não queria acreditar mas era verdade, as televisões nos prédios, transmitindo em altos berros as conversas das cobaias não eram afinal indícios de
idiotia e imbecilidade mas sim autênticas aulas de comportamento humano, sempre comentadas por uma ilustre académica, dignas de qualquer anfiteatro universitário, e os comentários no dia seguinte
às atitudes e conversas das ditas cobaias não eram (como eu pensava inocentemente) baboseiras absurdas sobre assuntos idiotas mas sim verdadeiras permutas de informação entre cientistas tal como
as observamos nos corredores das universidades! Fenomenal!
Foi então que notei que estas aulas são, pasme-se, grátis! Um espanto!
Temos que agradecer à estação de televisão promotora desta iniciativa tão louvável!
E agradecer não chega, temos que participar nesta aposta no futuro da sociedade e do país pois todos juntos não seremos demais.
Uma câmara de televisão em cada casa será o meio necessário para provermos de material de estudo todas as pessoas que pretendam dedicar-se a esta actividade
tão cativante.
O futuro promete mas o presente arrepia já caminho a passos largos.
Podemos já imaginar a D. Gertrudes tomando apontamentos sobre o comportamento alarve do Sr. Antunes à mesa, com vista a elaborar uma tese, enquanto a câmara instalada
na casa da dita senhora permite à D. Gabriela elaborar um gráfico sobre as actividades mictórias da mesma. Admirável mundo novo!
21-11-2000
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